quinta-feira, 12 de abril de 2012

NO STF, PGR DEFENDE ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DO PARTO DE FETO ANENCÉFALO




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O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, defendeu hoje, 11 de abril, no Supremo Tribunal Federal (STF), o direito fundamental da gestante de interromper a gravidez de feto anencéfalo. A manifestação ocorreu durante o julgamento de arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 54) ajuizada em 2004 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS). Sob o argumento de ofensa à dignidade humana da gestante, a entidade defende a descriminalização da antecipação do parto em caso de gravidez de feto anencéfalo. Para a Procuradoria Geral da República, a ADPF 54 deve ser julgada integralmente procedente.

Em sua manifestação, Roberto Gurgel assinalou que a discussão sobre a antecipação terapêutica do parto de fetos anencéfalos situa-se no domínio da medicina, sem que isso envolva quaisquer escolhas morais relacionadas à interrupção voluntária da gravidez viável. O que é defendido pela Procuradoria Geral da República é o direito fundamental da gestante de decidir sobre o prosseguimento, ou não, da gestação em caso de anencefalia. Gurgel ressaltou que não se pretende obrigar a gestante a interromper a gestação, “o que seria uma terrível violência para aquelas que, em decisão livre, preferissem levar sua gravidez até o final”. Diferentemente, ressaltou Gurgel, “o que se está sustentando é que a escolha sobre o que fazer nessa difícil situação tem de competir à gestante, e somente a ela, que deve julgar de acordo com seus valores e a sua consciência, e não ao Estado”. 

A restrição à interrupção de gravidez de feto anencéfalo não se sustenta juridicamente, afirmou Roberto Gurgel. Para ele, a ordem constitucional, apesar de proteger a vida potencial do feto, não o faz de forma tão intensa quanto tutela a vida após o nascimento. O procurador-geral da República defende que o equacionamento da complexa questão da interrupção da gravidez de feto anencéfalo seja feita por meio da ponderação da proteção à vida do feto e dos direitos humanos das gestantes. Assim, para o procurador-geral da República, o fato de não haver qualquer possibilidade de vida extrauterina “não justifica, do ponto de vista dos interesses constitucionais envolvidos, uma restrição tão intensa ao direito à liberdade e à autonomia reprodutiva da mulher”. Ele afirmou ainda que a atual proibição “se trata de uma restrição desproporcional e desarazoada a um direito fundamental de elevada importância na escala de valores da Constituição”. Para Roberto Gurgel, a autonomia reprodutiva da mulher tem fundamento constitucional nos direitos à dignidade, à liberdade, e à privacidade. 

Além do aspecto constitucional, a interrupção da gravidez do feto anencefálico não lesa os bens jurídicos tutelados pelo Código Penal, afirmou Gurgel. Ele esclareceu que, por não haver crime sem ofensa direta a um bem jurídico, a antecipação do parto de feto anencéfalo não ofende o direito à vida. “Se o bem jurídico protegido pelas normas que tipificam o delito de aborto é a vida potencial do feto e, se na interrupção de gravidez de feto anencefálico não é a ação da gestante ou de profissonais da saúde que impede o seu nascimento com vida, o tipo penal não se caracteriza.” Daí por que entende a Procuradoria Geral da República que a antecipação terapêutica do parto de fetos anencefálicos não se configura crime.

Dignidade humana - Em sua manifestação, Roberto Gurgel também defendeu o respeito ao princípio da dignidade humana. Ele afirmou que, “quando o Estado impede uma gestante de um feto absolutamente inviável de interromper a gravidez, privando-a de sua autonomia decisória e impondo a ela um grave sofrimento, viola ostensivamente o princípio constitucional da dignidade humana, igualmente o direito à saúde”. Ele enfatizou o argumento da autora da ação, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, sobre o abalo à saúde psíquica da gestante. Para Gurgel, “o diagnóstico da anomalia do feto e a impossibilidade de sua sobrevivência fora do útero já acarretam, em regra, um sofrimento profundo para as gestantes e suas famílias. A proibição de interrupção da gravidez nestas trágicas circunstâncias tende a prolongar e a agravar injustificadamente essa dor”.

Para a Procuradoria Geral da República, a antecipação terapêutica do parto de feto anencéfalo não representa qualquer violação ao direito à vida. O procurador-geral da República destacou que, “na anencefalia, não há sequer a vida potencial do feto. A rigor, a interrupção da gestação apenas abrevia um desfecho inevitável. Daí porque é cabível a analogia entre a situação do anencéfalo e a do paciente que teve diagnosticada a morte encefálica, no qual pode ser realizada a retirada de órgãos para fins de transplante”. Nesse sentido, não se pode supor qualquer analogia entre a antecipação do parto e o aborto eugênico, caracterizado pela interrupção da gravidez em caso de viabilidade do feto, o que não se verifica em caso de anencefalia. Dessa forma, concluiu Roberto Gurgel, “é total a improcedência de querer assemelhar a antecipação terapêutica do parto ao aborto eugênico, que é absolutamente inaceitável do ponto de vista moral”. 

Julgamento - A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54 foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal em 2004 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS). A entidade defende a descriminalização da antecipação do parto em caso de gravidez de feto anencéfalo. A CNTS alega ofensa à dignidade humana da mãe o fato de ela ser obrigada a carregar no ventre um feto com chances mínimas de sobreviver após o parto. Ainda em 2004, o ministro Marco Aurélio, relator da ação, concedeu liminar que autorizava a antecipação do parto para gestantes de fetos anencéfalos, quando a deformidade fosse identificada por meio de laudo médico. Três meses depois, o Plenário do STF cassou a liminar concedida pelo relator. Em 2008, o STF promoveu audiência pública para debater o assunto. O julgamento do mérito da ação iniciou na manhã desta quarta-feira, 11 de abril. 

Secretaria de Comunicação

Procuradoria Geral da República

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